Acho que meu corpo nasceu pronto para amar. Acho que o tamanho do meu corpo já foi pré moldado a não caber. Não caber amores, danças, flores. Aqui de dentro vejo tudo trêmulo como se ventasse todo o tempo. Aqui de dentro tudo é grande. Algo me diz que meus pés já tinham potência de danças e vôos mesmo antes de aprender a andar. Tudo em mim reluz e cintila com uma música sempre presente, mas que nunca se fez ouvir. Deve ser por isso que gosto de me fazer girar, girar e girar com os braços bem abertos, com os braços bem abertos. Quando estou só. Porque só assim posso dançar meu passo. Aquele passo que ninguém me ensinou. Aquele passo cabeça solta que roupas fazem no varal. Aquele em que me estico toda, tentando tocar tudo além de mim, tudo além do meu centro. E quanto mais eu giro e fico tonta, mais parecidas ficam as coisas de fora com o que vejo delas aqui de dentro.
quinta-feira, dezembro 21, 2006
segunda-feira, dezembro 11, 2006
Palavras d'água
Quando a vejo, sinto pequeninos espasmos percorrerem apressados todo o corpo da minha alma.
O sorriso dela me mata. Eu ressuscito depois, mas por segundos estou morta. Morta parada impotente. Morta de frios. Morta de frios empoeirados que me sopram passados. Meus frios imaginários.
Percebi que a tristeza que me dá, é tristeza d’água. Não é tristeza de pedra quase raiva. É aquela que pinga, que enche, que transborda. E evapora sim, em seu tempo, no varal de dentro.
O que me desmancha não é ela. Mas é que ela encarna todo um passado que não pude ser. Ela é, para mim, a imagem de todas as outras elas. De todas as palavras que não pude escutar. De todos os lugares em que não estive, de todos aqueles sorrisos e caras de sono que não vi.
É que sinto meus olhos grávidos de amores e dores, insolúveis em lágrimas.
É que eu tenho cá dentro um amor tão grande, grande, que mesmo explodindo fora dos limites do meu corpo, quase que me sufoca!
É que eu quase me sinto ligada àqueles sorrisos e caras de sono por um fino fio brilho que nos sai do umbigo.
É que tenho vontade de lhes ser pão e mar. Passado e futuro. Talvez daí a minha urgência, da nostalgia de um passado já passado, do medo de um futuro ainda ausente.
segunda-feira, dezembro 04, 2006
Carta feita para nunca ser entregue
Que a vida é dura eu sei porque você me fez saber desde sempre que a vida é dura. Mas Maria, a vida pode ser dura o quanto for que eu ainda quererei permanecer mole. Sei que talvez não me entenda e que isso não lhe seja, nunca e ainda talvez, motivo de orgulho. Mas é que a minha moleza pode ser maleável, querida. Nunca quero endurecer, nunca quero deixar de escorrer. E sei que você também nunca quis. Sei que suas mãos, hoje tão grossas e traídas pelo cinza que há (e que não gosto) na vida, já tocaram delicadezas com toques suaves. E sei que ainda há de haver entre esses dedos brutos, vestígios de flores. Sei porque sei nos seus cabelos um ainda brilho vistoso, uma ainda vida e uma ainda esperança. Sei que seu ronco é acúmulo de supiros cansados. Sei que você é líquida e toda líquida aí por dentro do por dentro do por dentro de você. Assim como eu. Ou eu o sou assim como você é. Porque dos seus líquidos me originei, dos seus líquidos e das suas coxas. Do seu gozo, suor e sangue. E das suas lágrimas. Eu não admiro sua crueza, minha Maria. Mas eu admiro o que há por dentro e que sai sob seu consentimento com tanta facilidade dos olhos seus. Eu admiro suas lágrimas, seu queixo trêmulo, seus arrepios. É que você é dura de verdade por fora, mas ainda permite a saída de seus líquidos. E talvez eu também seja assim dura às vezes, como quando me enraiveço e enrubesço "dando uma lágrima ao mundo", ou ainda, quando penso ser frio um arrepio. Quem sabe, num dos últimos dias, eu a peça ajuda para saber diferenciar? E quem sabe ainda, eu até aprenda...
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