quarta-feira, janeiro 24, 2007

Instante natimorto


Hoje eu tô de cor tremida e desfocada.
Não tô querendo nada além de nada.
Hoje é dia de pijama sem mágica e sem graça.
Dia de dia ofuscado com trilha sonora de chiado.
Hoje sou um vulto de mim.
Hoje não faço nem questão de "mim".
Sombra sem glamour fantástico:
Sou o fim da fumaça, espalhada no ar apático.
Sou o sono do esquecimento, daqueles sem sonho dentro.
Sou o vento morno que desfolha as letras.
Sou espaço mudo e oco.
Agora com licença, vou ali morrer-me um pouco.

terça-feira, janeiro 23, 2007

Dama de Copas


Vermelho sim.
Porque é ardência o que há em mim.
Ferve ao mínimo contato,
Físico e abstrato.
Vermelho é superdose latente.
É quente, urgente.
Vermelho jorra da minha alma pela boca, me inunda.
Habita minhas entranhas, corre nas artérias, palpita no meu corpo: cor fecunda.
Amarelo é vômito morno, laranja, covardia.
Toda cor aspira ser vermelho um dia.


segunda-feira, janeiro 22, 2007

Impressões


Agora eu era uma borboleta de asa quebrada.
Eu já era borboleta toda, livre de casulo.
Mas minha asa, quebrada.
Vivia entre flores e maravilhas fantásticas.
E era feliz e triste, admirando os vôos altos, trêmulos e vibrantes de outras borboletas coloridas.


Para a dor do oco não há nestesia.

Entenda, não me falta sensibilidade. Me sobra.

O mundo em mim fica num silêncio sensível e arrepiado quando marcado pelas intensidades imensas do mundo que não é meu.

Fico quieta, parada, admirada. Com medo de me mover para o segundo não me escapar. É quase como pescar. E eu que nunca pesquei nem peixe, nem segundo.

Às vezes frágil como asa de borboleta partida,
Às vezes forte como coifa sedenta de vida.
Orgânica.


E apaixonada por olhos de espelho. Cor indefinida e misteriosa de metal brilhante e reluzente de águas transparentes.

Agora entendo o significado escondido de um olho d’água. Nascente. Esplendor suspenso. Lâmina espelhada refletindo para o exterior águas de lençóis profundamente freáticos. Olho do fundo da terra, do duro da terra, do âmago da terra que vem olhar a superfície. Que vem molhar de lágrima a superfície.

Às vezes o que há de medo quebrado no fundo dos meus olhos tenta procurar nos dele resquícios de um futuro amor rasgado – rasgado como meia de seda rasgada, arranhada na pele, sem conserto nem disfarce.

Logo depois meus olhos fecham. E esses cacos doloridos inexistem. Se dissolvem no que é quente e liso do corpo dele.

Naquele colo, o que é casulo em mim se rompe em impressões contorcidas.

Naquele colo, o que é casulo em mim desnuda-se num vôo de mil borboletas coloridas.